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Sebos resistem ao tempo e se reinventam na era digital

André Luís
Repórter

Mesmo diante da era digital, com o avanço constante da tecnologia e um cotidiano repleto de telas, os sebos resistem ao tempo e encontraram na internet uma forte aliada para manter viva a paixão do público pelos livros físicos. Eles seguem se reinventando em meio às novas demandas, conquistando leitores de todas as idades e sendo grandes centros culturais de suas cidades. Fundado em Natal há mais de 50 anos, o Sebo Cata Livros se adaptou às mudanças tecnológicas, como a adesão ao uso das plataformas digitais, que possibilitou a longevidade do sebo e também atraiu clientes de todo o Brasil.

Idealizado por Jácio Torres e Verônica Torres na década de 70, o Cata Livros começou no bairro do Alecrim e teve unidades em Morro Branco, Cidade Alta e Lagoa Nova. Atualmente, está localizado no Mercado de Petrópolis e na avenida Prudente de Morais, em Lagoa Seca. O sebo dispõe de um vasto acervo, que vai desde livros até discos de vinil, máquinas de datilografia, telefones antigos e histórias em quadrinhos. Atualmente, o local é administrado por Verônica, também conhecida como Vera, e seu filho, Ramon Lima, após o falecimento de Jácio em fevereiro deste ano.

“O sebo começou com o Jácio, junto ao tio dele, quando ele era adolescente. Ficava com o tio na banca, que era em frente ao Cinema São Luís, onde hoje é o Banco do Brasil. Jácio ficava lá com o tio, só que o tio dele vendia discos e revistas em quadrinhos. Após o falecimento do tio, ele assumiu. Quando assumiu a cigarreira de novo, Jácio introduziu os livros, e foi bem bonito assim, porque foram chegando naturalmente”, conta Vera, esposa de Jácio.

Vera revela que a modernização do sebo começou por iniciativa do filho, Ramon, com o uso da Estante Virtual e a criação do perfil no Instagram para a divulgação do acervo. “Esse momento foi interessante porque o meu filho despertou para os livros. A gente sempre dizia (para usar a) Estante Virtual, porque o jovem tem mais aproximação com o computador, mexe melhor na internet”, disse.

Ramon relembra que iniciou as vendas na internet com o propósito de ajudar os pais, Vera e Jácio, a arcar com as despesas de casa. Segundo ele, a plataforma foi essencial para a sobrevivência do sebo durante o período da pandemia. “A venda pela Estante Virtual foi muito forte, aumentou muito. Tanto que, depois que começou a normalizar o comércio, a gente viu uma queda. Durante (a pandemia), foi muito importante também para a sobrevivência, porque o movimento estava parado na loja física. De lá, a gente conseguiu se manter também”, explicou.

“Também comecei a movimentar a página do Instagram, fiquei responsável e, até hoje, vejo um potencial muito grande. As vendas diárias chegam a 40% do que o povo vê pelo Instagram, das postagens diárias. Vamos tentando aperfeiçoar cada vez mais as publicações e trazer coisas novas. Sempre estar postando e sempre chegando mais gente também para seguir a gente”, afirmou Ramon. O perfil do Cata Livros no Instagram conta com mais de oito mil seguidores e na Estante Virtual, são 3.863 livros registrados e uma avaliação positiva de 98% do público.

Apesar da grande preferência pela mídia digital, ainda há muitas pessoas que apreciam os livros físicos, principalmente o público mais jovem, revela Vera. A sebista observa um interesse expressivo dos jovens pela leitura de livros, histórias em quadrinhos e, mais recente, os mangás. “Tem uma galera jovem muito ligada em livros. Participamos de uma feira, por exemplo, que acontece na Árvore de Mirassol. Passamos 40 dias naquela feira. É uma coisa assim, bonita e impressionante. Os jovens comprando livros, quadrinhos, essa onda do mangá”, conta.

“O sebo é uma aula de história para uma criança. Ela entra, vê disco, máquina de datilografia, telefone, toca vinil, coisas que só tem em museu. O sebo tem essa parte cultural muito bonita”, acrescentou a sebista.

Além de manter viva a cultura do sebo para que as próximas gerações também possam vivenciar essa experiência, Vera e Ramon assumiram uma nova missão: preservar o legado de Jácio Torres. O trabalho teve início em um período em que praticamente não existiam sebos em Natal e, após Jácio dar o pontapé inicial no ramo, outros começaram a surgir. “Eu, como companheira dele, me apaixonei também pelos livros. Hoje o nosso filho, ele tem esse amor pelos livros. Isso foi muito importante para ele, tenho certeza. Jácio conseguiu passar esse amor que ele tinha por livro, tanto para mim como para o filho. Hoje a gente vai dar prosseguimento a esse sebo dele”, diz.

Sebo Vermelho vai completar 40 anos

Com um acervo de livros variados, com autores potiguares, nacionais e internacionais, o Sebo Vermelho, em Cidade Alta, está em Natal desde 1985. Próximo de completar 40 anos de existência, o sebo se notabiliza por ser o único que edita livros no país. A história começou pelo desejo de Abimael Silva de trabalhar em uma livraria. Ele optou por montar o próprio sebo a partir da sua biblioteca em casa, que contava com mais de 600 livros. Com o dinheiro que conseguiu da indenização após ser demitido do banco onde trabalhava, Abimael montou a cigarreira.

“Mandei fazer uma cigarreira e coloquei ali no Beco da Lama, pintei de vermelho porque só tinha até cigarreira branca, azul, amarela e verde. Mas hoje não tem quase nenhuma, toda vermelha e nem preta. Aí eu resolvi pintar de vermelho e botei os meus livros. As pessoas chegavam assim, alguns diziam, aqui é o Sebo Vermelho. Eu disse, pronto, o nome vai ser esse”, relembrou Abimael.

O sebista e editor confessa que não notou o impacto dos avanços tecnológicos, principalmente, quando trata-se de livros. Ele reconhece a necessidade de modernizar o sebo diante das novas demandas e atrair públicos de várias localidades, como já aconteceu, quando uma pessoa em Sydney, na Austrália, entrou em contato para comprar um livro sobre famílias do Nordeste brasileiro. “Eu nem entro nessas tecnologias. Absolutamente nada. Por exemplo, tem muita gente que vem aqui, pega algum livro desse que eu editei, aí diz, não, mas eu quero o digital, eu quero o eletrônico e isso. Quanto é? Digo, não. A gente só vende o livro físico”, expõe.

“Estamos ainda nesse tempo, de máquina de escrever, estou até escrevendo um livro sobre a história da Redinha, que será lançado no próximo sábado. Mas até o momento, o Sebo Vermelho é razoavelmente anti dessa modernidade. Quando há o lançamento de um livro que tem uma boa mídia, fazemos propaganda, muita gente entra em contato e diz que viu e está interessada. ”, acrescenta Abimael.

Atualmente, o Sebo Vermelho contabiliza mais de cinco mil seguidores em seu perfil no Instagram. “Fazemos propaganda, as pessoas entram em contato via Instagram e WhatsApp e mandamos para todas as partes do Brasil. Teve um livro que eu editei aqui sobre as famílias do Nordeste brasileiro, uma pessoa da Austrália, de Sydney, entrou em contato e comprou o livro”, conta o sebista.

O interesse do público jovem pelos livros físicos também é algo observado por Abimael. “Muita gente diz também, a internet, o computador está acabando com os livros, ninguém mais compra livro, pelo contrário”, disse. Ele revela que frequentemente há procura dos jovens por obras de autores conhecidos, como Charles Bukowski, John Fante e Câmara Cascudo, e a depender do preço, compram sem nem pensar duas vezes.

Durante os quase 40 anos de história, o Sebo Vermelho também se notabilizou pelo seu trabalho na edição de livros, com mais de 660 títulos publicados, principalmente, sobre a história de Natal, do Rio Grande do Norte e do Nordeste. Fato esse que também contribuiu para a longevidade do sebo e o vínculo com o público, em razão também, de serem obras pouco privilegiadas pelas livrarias tradicionais. Mesmo diante dos avanços, com computadores disponíveis, Abimael realiza todo esse trabalho à moda antiga, utilizando máquinas de escrever.

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