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Alunos usam ventiladores e leques em sala de aula

Maria Fernanda e Maria Clara passam o dia inteiro na Escola Estadual Walfredo Gurgel, em Candelária, na zona Sul de Natal, onde cursam o Ensino Médio integrado ao Técnico. O ventilador portátil é companhia constante de Fernanda, enquanto Clara pega emprestado o leque das amigas de vez em quando para se refrescar. Isso porque apenas seis das 19 salas da unidade possuem ar-condicionado e, como os estudantes mudam de classe conforme a disciplina, grande parte do dia eles ficam em ambientes sem climatização. A realidade é a mesma da maioria das escolas públicas no RN, onde, das 17.178 salas de aula, apenas 7.904 (ou 46%) são climatizadas.

Os dados são do Censo Escolar de 2023, que registrou na rede pública de todo o Brasil, um total de 1.094.377 salas de aulas utilizadas pelas escolas (o número considera as salas de aula construídas e/ou adaptadas para a utilização permanente em atividades de ensino-aprendizagem). No entanto,desse quantitativo foram registradas somente 372.033 (ou 34%) salas de aula climatizadas. O percentual registrado no Rio Grande do Norte, portanto, está acima do índice do País, mas ainda assim, há uma lacuna importante, uma vez que, no Estado, pouco mais da metade das salas não têm climatização. As altas temperaturas dos últimos tempos – 2024 foi considerado o ano mais quente da história – ajudam a tornar a situação ainda mais crítica.

O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável por coordenar o Censo Escolar, classifica como sala de aula climatizada aquela que possui equipamentos (ar-condicionado, aquecedor ou climatizador) em funcionamento para manter a temperatura do local adequada. Na Escola Estadual Walfredo Gurgel, foram instalados ventiladores nos ambientes onde não existe ar-condicionado, mas a medida é insuficiente para driblar o calor. A quantidade de alunos, que costuma variar de 30 a 40 alunos por turma, contribui para tornar os espaços insalubres do ponto de vista das altas temperaturas.

Socorro Morais, diretora da escola, conta que, diante do cenário, o uso dos ventiladores é praticamente insignificante. “Temos ventiladores instalados nas paredes e também aqueles de pé, porque realmente o calor é muito forte”, relata. Alem da ausência dos aparelhos de ar em mais da metade das salas, a falta de manutenção nos equipamentos existentes, que são antigos, prejudica alunos e professores. “Na sala 4 há dois ares, mas somente um está funcionando. Nós compramos o aparelho novo e estamos aguardando a instalação, que só pode ser feita pela Secretaria de Educação [SEEC]”, diz.

A diretora comentou não ser possível ampliar o número de salas com ar-condicionado sem antes renovar toda a rede elétrica atual, que não comporta uma quantidade maior de equipamentos. “Para isso, é preciso uma subestação, que é um pleito nosso desde 2017”, afirma Socorro Morais. A reportagem pediu um posicionamento à SEEC sobre a situação da escola, mas a pasta não respondeu de forma específica sobre a unidade.

Em nota, a Secretaria disse que a orientação da gestão da SEEC à engenharia é que todas as escolas que passam por obras sejam contempladas com adequação da rede elétrica para permitir a instalação de aparelhos de ar-condicionado. “Nos últimos dois anos, cerca de 150 unidades já foram reformadas ou estão em processo de reestruturação elétrica e estrutural”, informou a pasta.

“Todo mundo no pátio”
Sem climatização, alunos e profissionais sofrem para estar em sala de aula. Maria Fernanda, de 16 anos, aluna da 2ª série da Walfredo Gurgel, conta que utiliza um ventilador portátil para tentar aliviar o calor. “É um miniventilador que eu carrego para todo canto. Fora isso, a gente corre quando chega à sala para pegar o local mais arejado, porque a situação é muito difícil, principalmente a partir de meio-dia. Quando está nos intervalos, o pátio é o lugar onde todo mundo quer ficar, porque é ventilado”, descreve a estudante.

A amiga e colega de turma de Fernanda, Maria Clara, de 15 anos, diz que “todo dia tem briga” por conta do ventilador. “No meu caso, uso também várias estratégias: abro a janela, prendo o cabelo, mas ainda assim é difícil”, relata. Na Escola Estadual Dulce Wanderley, na Redinha, zona Norte de Natal, a expectativa é de que a realidade de salas quentes irá mudar em breve. De acordo com Cláudia Queiroz, diretora da unidade, uma reforma será concluída no próximo dia 15, com toda a rede elétrica renovada para comportar a instalação de ar-condicionado.

“Por enquanto, utilizamos ventiladores, mas ainda assim as salas ficam muito quentes, porque temos uma média de 40 alunos por turma. Os períodos entre 10h e a parte da tarde são os mais críticos. Quando a situação está muito extrema, nós reduzimos o horário de aula para que os alunos fiquem um pouco mais de tempo ao ar livre. Com a reforma, a gente espera que até o meio do ano, os aparelhos de ar sejam instalados”, diz Cláudia. A Dulce Wanderley possui 13 salas de aula, das quais três são utilizadas para outras atividades como biblioteca e espaço de convivência. Nenhuma possui ar-condicionado.

Apesar de o número de salas de aula sem climatização em escolas públicas ser alto no RN, em outros estados do Nordeste a situação é bem mais complicada. Na Bahia, de acordo com o Censo Escolar de 2023, apenas 21% das salas da rede pública têm climatização, o pior índice da região. Sergipe e Ceará, com índices de 24% e 28%, respectivamente, também figuram entre as unidades federativas do Nordeste com maior precariedade quanto às condições de climatização das escolas. Todos os estados nordestinos apresentam índice inferior a 50%. Alagoas e Piauí, ambos com 42% das salas de aula públicas climatizadas, somam-se ao RN entre os melhores colocados da região. No País, Rondônia (com índice de 89%) e São Paulo (apenas com 9%), são os estados com melhor e pior desempenhos.

Somadas as escolas públicas e privadas, o Rio Grande do Norte tem 53% das salas de aula climatizadas. A TRIBUNA DO NORTE procurou a Secretaria Municipal de Educação de Natal (SME) para obter um panorama da situação na capital. A SME esclareceu que, atualmente, “123 unidades de ensino são climatizadas de forma total e/ou parcial, totalizando cerca de 1,4 mil aparelhos de ar-condicionado. O planejamento é de que até o final do primeiro semestre deste ano, as outras 24 unidades restantes sejam beneficiadas”.

Segundo a pasta, no entanto, é necessário que antes ocorra o aumento de carga de rede, uma vez que, a demanda atualmente oferecida pela Cosern é inferior ao que a SME precisa para todas as unidades de ensino. “Importante ressaltar que todos os processos já estão protocolados e as solicitações enviadas para a Cosern, que são por sua vez, acompanhadas e despachadas diretamente pela SME-Natal junto à Cosern”, informou a Secretaria.

O Ministério da Educação (MEC) também foi procurado e disse em nota que “disponibiliza assistência técnica e financeira aos entes federados por meio do Plano de Ações Articuladas (PAR) para ações de climatização das salas de aula das escolas das redes públicas de ensino, com apoio para a aquisição de ventiladores escolares e aparelhos de ar-condicionado”.

Impactos
As altas temperaturas em sala de aula interferem no aprendizado dos estudantes, com impactos como falta de concentração, que afetam também os professores, conforme avaliação do presidente do Conselho Estadual de Educação, Aécio Cândido. “Estudar é um trabalho intelectual, e certamente há condições ideais para que esse trabalho seja realizado de modo satisfatório e prazeroso. O desconforto térmico é sem dúvida um problema, e como tal merece ser enfrentado”, analisa Cândido.

Quem enfrenta diariamente a situação, sabe bem como pode ser difícil aprender – e ensinar – nestas condições. “Os alunos ficam agitados e todo o desempenho (deles e nosso) fica comprometido”, fala a professora de Português e Espanhol Suyanne Moraes, da Escola Estadual Walfredo Gurgel. “É difícil, porque atrapalha totalmente minha concentração”, afirma Maria Fernanda, aluna da Walfredo.

Calor

Índice de salas de aula climatizadas em escolas públicas (por estados do NE)

RN: 46%
AL: 42%
PI: 42%
PE: 35%
PB: 38%
MA: 36%
CE: 28%
SE: 24%
BA: 21%

Fonte: Inep

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